Sem dieta, sem detox: no caminho da liberdade alimentar. Parte IV.

Por Enrico Torres

 

Deu match?

Sua relação mais profunda é entre você e aquilo que você come.

Olá, esse texto faz parte de um conjunto de 5 artigos que exploram como reaprender a arte de comer. Para um entendimento mais completo, eu sugiro a leitura de todos eles, preferencialmente na sequência do artigo I ao V. Espero que goste.

Após um certo ponto de nossas vidas, descobrimos a libertação gloriosa de poder escolher o que queremos comer, se o bolso permitir. Mas nossos gostos e escolhas alimentares ainda são formados por essas experiências da primeira infância. 

Aprendemos a comer na maioria das vezes sem perceber o que estamos fazendo, diferente da forma como aprendemos a andar de bicicleta ou a contar, por exemplo. Da mesma forma, nem sempre percebemos quando incorporamos maneiras de comer que são nocivas para a nossa saúde, porque elas normalmente são inseridas por meio de atitudes muito amigáveis e familiares. Ter gostos particulares é uma das maneiras pelas quais sinalizamos para outras pessoas que somos incomuns e especiais. Somos conhecidos como a pessoa da família que adora chupar limão ou que come a casca da jabuticaba.

Você pode não gostar de um determinado alimento. O perigo é quando você não gosta de grupos de alimentos inteiros, deixando-o incapaz de obter a nutrição necessária em sua dieta* (lê-se*: cota habitual de alimentos). Os médicos que trabalham na linha de frente da obesidade infantil dizem que se tornou comum nas duas últimas décadas casos de crianças que não comem frutas e vegetais. E esta é uma das razões pelas quais a constipação é agora um problema tão grande - embora pouco mencionado - nos países ocidentais, dando origem a 2,5 milhões de consultas médicas por ano nos EUA.

 

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Alguns pensam que realmente não importa se as crianças têm gostos prejudiciais, porque, ao crescerem irão adquirir, sem esforço, um interesse pela salada, juntamente com uma voz mais firme e opiniões políticas formadas.

Nem sempre funciona dessa maneira. Muitos gostos - como chá verde, por exemplo, ou até mesmo vodka - são adquiridos na idade adulta. Quando aprendemos a amar essas substâncias amargas, passamos pelo que os psicólogos chamam de "mudança hedônica" da dor para o prazer. 

Você pode superar sua repulsa infantil pela amargura do café expresso ao descobrir os seus maravilhosos efeitos colaterais, como o de deixá-lo mais desperto e potencializar seu dia de trabalho.

A grande questão é o que é necessário para uma mudança hedônica semelhante a essa e passarmos a desfrutar de uma dieta moderada de alimentos saudáveis.

O processo será diferente para cada um de nós, porque todos nós aprendemos nossa maneira particular de comer, mas, onde quer que você comece, o primeiro passo para comer melhor é reconhecer que nossos gostos e hábitos não são fixos, mas mutáveis.

A pobreza dificulta o acesso a uma alimentação saudável de várias maneiras.

Não é apenas porque é mais caro comprar legumes frescos do que comprar carboidratos altamente processados, pão, massa, biscoitos ou bolachas.

Talvez você viva em um local onde seja difícil encontrar ingredientes nutritivos; ou em uma casa sem uma cozinha adequada. Crescer pobre pode gerar uma vida inteira de hábitos alimentares não saudáveis, mesmo que sua renda cresça mais tarde.

Quando o sabor do pão branco e da carne processada está ligado em sua memória ao calor e a autoridade dos pais e a amizade dos irmãos, pode parecer uma traição parar de comê-los.

No entanto, é surpreendente que algumas crianças de famílias de baixa renda comam muito melhor que outras e, às vezes, melhores que crianças de famílias mais ricas.

Os problemas de como comemos agora ultrapassam os limites de classe e renda. É possível criar refeições saudáveis ​​e decentes com um orçamento apertado.

Da mesma forma, pode-se ter recursos para comprar comidas mais sofisticadas, mas de nada adianta se não há interesse em fazer isso. De acordo com os terapeutas alimentares com quem conversei, supondo que você não esteja vivendo um estado de fome, o maior determinante de quão bem você come é a maneira como aprendeu a se comportar em relação à comida.

 
 
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Esse comportamento geralmente é muito complexo, alterar os hábitos alimentares têm um impacto direto na vida das pessoas. Em 1998, o psicólogo social Roy Baumeister fez um experimento famoso.

Baumeister, conhecido por seu trabalho sobre comportamentos autodestrutivos, convidou um grupo de pessoas para comer alimentos "nutritivos", como rabanetes, em vez dos alimentos que eles realmente queriam, como chocolate, cookies e descobriu que a força de vontade dessas pessoas começou a cair com um todo. Eles ficaram tão exaustos e deprimidos realizando essa tarefa que, quando colocados para realizar outra tarefa, como resolver um quebra-cabeça complicado, desistiram mais rapidamente.

O esforço emocional de não comer os chocolates e cookies teve um "peso psíquico" afetando outras áreas da vida da pessoa.