Sem dieta, sem detox: no caminho da liberdade alimentar. Parte III.
Por Enrico Torres
Você é aquilo que te ensinaram a comer.
Olá, esse texto faz parte de um conjunto de 5 artigos que exploram como reaprender a arte de comer. Para um entendimento mais completo, eu sugiro a leitura de todos eles, preferencialmente na sequência do artigo I ao V. Espero que goste.
Uma vez que aceitamos que comer é um comportamento aprendido, vemos que o desafio não é apenas buscar conhecimento e informações, mas também aprender novos hábitos. Os governos continuam tentando controlar a crise da obesidade com recomendações bem-intencionadas. Mas conselhos por si só nunca ensinaram uma criança a comer melhor (“Eu recomendo fortemente que você termine esse repolho acompanhado de um copo de suco!”). Por isso é estranho pensar que esta solução funcionará com os adultos. A maneira como você ensina uma criança a comer bem é através do exemplo, entusiasmo e o colocando-a sempre em contato, com paciência, com comida de verdade.
Muitas das alegrias e armadilhas da alimentação infantil ainda existem para os adultos.
Como adultos, ainda nos recompensamos com guloseimas, assim como nossos pais, e evitamos o que nos dá nojo.
Há uma suposição comum, entre aqueles que lutam para comer de maneira saudável e por muitos nutricionistas que estão tentando fazê-los comer melhor, de que estamos condenados por nossa biologia. A história é mais ou menos assim: nossos cérebros evoluíram ao longo de milhares de anos orientados para buscar alimentos doces, porque na natureza precisaríamos ter uma forma eficaz de distinguir frutos doces bons para a saúde, nos poupando das toxinas presentes nos alimentos amargos e ruins. No mundo de hoje, onde os alimentos doces são abundantes, nossa biologia nos torna impotentes para recusar esses alimentos "irresistíveis".
Há quem consiga comer uma casquinha de sorvete em um dia quente sem precisar se punir com “não fuja da dieta”; que recusam automaticamente um snack porque ainda não é hora do almoço; que geralmente comem quando estão com fome e param quando estão satisfeitos; que sentem que uma refeição a noite, sem vegetais, não é realmente uma refeição. Essas pessoas aprenderam as habilidades alimentares que podem protegê-las neste ambiente de abundância.
Visto através das lentes da psicologia comportamental, comer é uma forma clássica de comportamento aprendido. Há um estímulo: um bolo de chocolate, com cobertura de brigadeiro. E há uma resposta: sua vontade de comer isso. Finalmente, há o reforço: o prazer sensorial e a sensação de plenitude que o ato de comer o bolo lhe proporciona. Esse reforço encoraja você a procurar mais bolos de chocolate sempre que tiver a chance e - dependendo de quão feliz você se sinta depois de comê-los - a escolhê-los em relação a outros alimentos no futuro.
Sabemos que grande parte desse aprendizado em busca de alimentos é impulsionada pela dopamina, um neurotransmissor conectado à motivação/recompensa. Este é um hormônio que é estimulado no cérebro quando seu corpo faz algo gratificante, como comer, beijar ou se divertir. A liberação de dopamina é um dos mecanismos que “influencia” nossas preferências de sabor e as transforma em hábitos.
Em nossas vidas, o comportamento estímulo-resposta em torno da comida é tão infinitamente complexo quanto o mundo social em que aprendemos a comer. Nosso ambiente alimentar moderno está repleto de contradições. O fardo da culpa religiosa que foi progressivamente inserido em nossas vidas particulares tornou-se algo intenso no campo da alimentação para alguns. Como pregadores hipócritas do equilíbrio do bem-estar, demonizamos muitas das coisas que consumimos com mais vontade, levando-nos ao exagero, a culpa e nos deixando em desacordo com o nosso próprio apetite.