Sem dieta, sem detox: no caminho da liberdade alimentar. Parte II.
Por Enrico Torres
Todo bom alimento merece uma chance.
Olá, esse texto faz parte de um conjunto de 5 artigos que exploram como reaprender a arte de comer. Para um entendimento mais completo, eu sugiro a leitura de todos eles, preferencialmente na sequência do artigo I ao V. Espero que goste. Enrico Torres.
Cerca de dois terços da população nos países ricos estão com sobrepeso ou obesidade; e o resto do mundo está alcançando esse nível rapidamente. O que podemos extrair dessas estatísticas é que não conseguimos resistir aos alimentos açucarados, salgados e gordurosos que a indústria alimentícia oferece. Entretanto, algumas pessoas conseguem comer alimentos cheios de açúcar, salgados e gordurosos em quantidades moderadas e depois param. Como elas fazem isso?
Muitos experts no assunto diriam que cozinhar é a resposta. Se apenas as crianças pudessem aprender a cozinhar e plantar hortas, elas se tornariam automaticamente mais saudáveis. Parece convincente, porém, essas coisas por si só não são suficientes para fazer uma criança se relacionar com a alimentação de maneira saudável. Nossa dificuldade não é apenas porque não aprendemos a cozinhar e cultivar alimentos, por mais importante que isso seja, mas é porque não aprendemos a comer com um olhar voltado para construção da nossa saúde e felicidade.
Na minha experiência como entusiasta e pesquisador sobre como o nosso corpo funciona, vejo que a maioria das pessoas possuem tendência de comer compulsivamente. E, para que o cozimento se torne a solução para a má alimentação, primeiro precisamos aprender a ajustar nossas respostas aos alimentos.
Como crianças, a maioria de nós só come o que gosta e só gosta do que conhece. A questão de como aprendemos a comer (individual e coletivamente) é a chave de como a alimentação, para tantas pessoas, deu tão errado. Quantas pessoas - com sobrepeso ou abaixo do peso - estão em um estado perpétuo de ansiedade sobre o que consomem, vivendo com medo de carboidratos ou gramas de gordura e incapazes de obter prazer direto das refeições? O maior problema de saúde pública dos tempos modernos é como persuadir as pessoas a fazerem melhores escolhas alimentares. Mas estamos procurando respostas nos lugares errados.
David L. Katz, do Centro de Pesquisa em Prevenção de Yale-Griffin, contesta a visão de que a razão pela qual não comemos melhor é porque há muita confusão sobre o que realmente é a "melhor dieta". “Nosso problema”, observa Katz, “não é falta de conhecimento sobre questões básicas da alimentação do Homo Sapiens. Nosso problema é uma relutância cultural impressionante trágica em não querer engolir "isso" (alimentos melhores).”
Pegue vegetais por exemplo. O conselho de comer mais vegetais para a saúde não poderia ser mais claro. Recebemos essa mensagem muitas vezes, de várias formas. Muitas pessoas, no entanto, absorveram na infância a informação de que legumes e prazer - e mais geralmente comida saudável e prazer - nunca podem andar juntos. Como publicitário de formação e tendo trabalhado com clientes da indústria alimentícia, posso afirmar que, quando um novo produto é descrito como "saudável" é muito menos provável que seja um sucesso de vendas do que se for descrito como "novo ou novidade".
Um tom de julgamento muitas vezes entra em discussões sobre obesidade, que vão desde afirmações sobre serem pessoas que nunca lutaram para mudar sua alimentação, até a piada de que tudo o que precisam fazer para emagrecer é "comer menos e se mexer mais". E a acusação para aqueles que não comem menos e se movem mais é a de não possuírem um senso moral ou inteligência. No entanto, a maneira como comemos não é uma questão puramente de valor, mas de uma série de fatores que vão desde distúrbios patológicos, passando por rotinas e preferências construídas ao longo de toda uma vida.
Quando se trata dos nossos hábitos alimentares, há uma grande incompatibilidade entre pensamento e ação; entre conhecimento e comportamento. "Coma comida de verdade. Não muita. Priorize legumes e verduras diversos.”, diz o influente escritor sobre alimentação Michael Pollan. Um mantra sábio e simples, muito repetido; no entanto para muitos, isso não passa apenas de simples palavras sem valor.
Como o filósofo Caspar Hare disse: "Não é tão fácil adquirir ou abandonar preferências apenas por vontade própria".